Élvio
O intelectual baiano e professor Titular da FACOM -UFBA Wilson Gomes postou recentemente em sua página do Facebook um parecer interessante que merece leitura.

"HOMOSSEXUALIDADE E HOMOFOBIA CRISTÃ

Acontece no Brasil, neste momento, um conflito tenso entre, de um lado, as lideranças cristãs conservadores do campo católico carismático e mais os evangélicos populares, e, do outro lado, os que se engajam na advocacia de respeito, reconhecimento social e direitos da homossexualidade (não vou dizer “os homossexuais” nem “os movimentos homossexuais” porque não acho que estes sejam os únicos atores, nem necessariamente os principais, neste campo).

Os lados não estão mais simplesmente em oposição, mas em polarização - situação em que cada vez se adotam posições mais radicalizadas e de confronto direto.

Há razões históricas para isso.

Afinal, a discriminação dos homossexuais é secular e extremamente disseminada, de forma que quando novos atores e agendas de reivindicação de direitos dos homossexuais e de reconhecimento da homossexualidade conseguem emergir na esfera pública, isso desinstala completamente os acordos silenciosos sobre o significado e o valor da homossexualidade. Estamos numa fase do processo que se pode popularmente chamar de “freio de arrumação”; as coisas ainda estão colidindo, até que se estabeleça uma nova acomodação, um novo acordo socialmente predominante.

Além disso, a posição mais moralmente conservadora, desfavorável aos homossexuais, desfrutou de arraigada hegemonia e de um consenso que encontrava na religião solo fértil para explicações e justificativas. As elites liberalizantes, com diferentes graus de distância deste acordo, formaram uma espécie de esfera silenciosa, pouco envolvida no tema ou pouco interessada em transformá-la em “problema social”. Neste momento (falo do Brasil), contudo, as elites da opinião pública tendem a deslocar a discriminação por orientação sexual para o âmbito das coisas detestáveis, ao lado racismo, do preconceito de gênero, origem e escolhas religiosas. O jogo virou. Quem domina a esfera da discussão pública tende a ser tolerante com respeito à orientação sexual (com respeito, aliás, aos fatos privados e da intimidade) e intolerante com respeito ao preconceito.
Neste quadro, a maioria desfavorável à homossexualidade, viu-se transformada em maioria silenciosa que, como sabe, tende a se tornar minoria justamente por não se apresentar na esfera pública (Espiral do Silêncio, baby!). Para os conservadores comuns, apenas mais lerdos na assimilação de novas ideias e novos valores, nenhum problema com isso. Afinal, tempora mutantur et nos in illis (o tempo muda e nós com ele). Mas os conservadores religiosos, mais radicais por definição e que fazem do proselitismo o seu modo de vida (isto é, vivem para fazer com que outras pessoas mudem de opinião e se convertam em disseminadoras de um ethos religioso e existencial), não conseguem assimilar uma mudança tão copernicana quanto essa nos seus valores e crenças.
Por isso, a ponta de lança do embate contra o novo ethos é protagonizada pelos líderes de grupos religiosos populares (por isso não compartilham dos valores das elites da opinião pública) e conservadores e pelo atual papa muito conservador do catolicismo romano.

Eles entraram em completo frenesi ao se ver confrontados com uma maioria que ou afirma a naturalidade da orientação homossexual e para ela reivindica reconhecimento e direitos ou silencia a respeito disso. Um frenesi completo e crescente, à medida que declarações públicas que, há poucos anos, eram compartilhadas pela opinião hegemônica, agora despertam uma gigantesca reação de repúdio e de contra-ataque. Não se sentem mais divergindo, se sentem atacados.

E o que fazem religiosos quando se sentem minoria? Adotam comportamento de seitas, que é baseado em três princípios: testemunho, evangelização e martírio. Testemunho significa que a sua vida tem que ser empregada para sustentar a sua crença: forçam-se a falar mais ainda daquilo de que “todo mundo” discorda, porque a rejeição “do mundo” é usada como prova de que estão certos; afinal, o mundo sempre abominou a luz e a verdade, pois não?

Evangelização ou proselitismo, porque se o mundo não conhece a verdade, é tarefa do crente apresentar esta verdade com persistência, dela não se desviando por nada, porque o justo vive da fé.

Martírio significa que é preciso demonstrar ao mundo que os termos da minha crença são para mim mais importantes do que esta minha vida (vou ganhar uma melhor depois da morte), seus prazeres e recompensas. Quanto mais pedras recebo, quanto mais as pessoas "do mundo" me insultam ou hostilizam, mas estou próximo da Verdade e de Deus.

Como sair desta encruzilhada?"
E tem como?
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